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À esquerda, José Edmar Inácio da Cruz (Zé do Mato) que anda de muletas por causa de uma fratura no tornozelo, apesar de ter passado por cirurgia. O outro é o Francisco Chagas (o Chagas) com seu inseparável cachorro. (Clique e amplie a foto) |
Durante dois
dias (12 e 13/07), conversei com vários moradores de rua de Arujá. O maior
grupo dorme próximo da rodoviária, outros passam a noite na Praça do
Coreto, além de outros ficarem dispersos pelo centro da cidade. Não se sabe ao certo quantas pessoas vivem nas
ruas em Arujá, mas os próprios mendigos avaliam que na área central da cidade são
mais de 30 pessoas.
No domingo (12/06) seis mendigos se encontravam próximos da
rodoviária, cinco homens e uma mulher, dois estavam dormindo. A maioria dos
homens mostrava barba grande, o semblante sofrido e a fisionomia de alcoólatra.
Com o grupo seus pertences, roupas e cobertores sujos e rasgados, além de dois
inseparáveis cachorros, gordos. Questionado como “se virava” nas noites frias deste
inverno, José Edmar Inácio da Cruz (Zé do Mato), 55 anos, disse que dorme no Posto de
Gasolina em frente da rodoviária, e que não passa frio, ele usa vários
cobertores. Zé do Mato, relatou ainda que nasceu em
Itapipoca (CE) e que mora em Arujá há 40 anos. Ele disse que foi um dos
primeiros moradores do Parque Rodrigo Barreto (veio em 1979) e que tem duas
casas no referido bairro. Um filho e uma filha (casados) residem nas casas
dele, e que os outros filhos também moram em Arujá. “Fui tecelão (tecelagem) no Bom Retiro (SP) durante
25 anos”, falou Zé do Mato. Questionado porque abandonou a profissão e virou
morador de rua, ele se limitou a dizer, que “perdi o juízo, fiz besteiras, mente
fraca”. Questionado das dificuldades de se viver na rua, Zé do Mato falou que está
acostumado com o preconceito das pessoas e nem liga quando é chamado de
vagabundo. Por outro lado, diz que ele (e o grupo) ganham marmitex e lanches, com a ressalva de que não
é todo dia.
Outro morador de rua, Francisco das Chagas dos Santos, 42 anos,
conhecido por Chagas, contou à reportagem que é duro viver nas ruas. “Além de discriminação,
sofremos muitas privações”. Ele disse que quem ajuda os moradores de rua é uma instituição
religiosa de Arujá (Casa Espírita Fraternidade da Luz) localizada na Estrada da
PL. “Todo sábado, eles pegam a gente de carro e nos levam até a igreja, lá a gente
toma banho, almoça, recebe roupas e sapatos, e ainda pode fazer a barba”. Chagas
contou que tem pessoas que doam comida, mas não é todo dia. Chagas contou ainda
que não se dá bem com a família, por isso está na rua. “Sou jardineiro,
carpinteiro e mecânico de carro”, disse.
Nesse momento da entrevista, uma
mulher se aproximou do grupo e ofereceu um cobertor que estava dentro de um
plástico. Chagas, sem titubear, agarrou o presente. A doadora do cobertor é
Kely Cristina. Ela estava voltando do trabalho (é empregada doméstica em um
condomínio de Arujá) e ia pegar o ônibus para casa, bairro Mirante. A única
mulher moradora de rua do grupo estava visivelmente embriagada. Com dificuldade de se articular,
ela se identificou como Claudia Rocha, 44 anos, natural de Três Corações,
cidade de Minas Gerais. Ela disse que tem um filho de 19 e uma filha de nove anos
que estão aos cuidados de familiares. Perguntada por que e quando passou a
residir nas ruas, ela começou a chorar, e o Zé do Mato pediu para encerrar a
entrevista.
Maioria é alcoólatra
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A direita, Kely Cristina, com os moradores de rua. Moradora do Mirante, ela deu um cobertor para o Chagas, que está sobre os joelhos dele |
Outros
moradores de rua conversaram com a reportagem, entretanto se negaram a informar
os nomes e não permitiram que fossem fotografados. As histórias são parecidas. Mesmo com a escalada da violência no
Brasil, eles dizem que não tem medo de dormirem ao relento, e que Arujá é
tranquilo. Durante a entrevista em frente da rodoviária, um rapaz novo de idade,
me questionou com rispidez. Ele queria saber quem eu era, e queria falar (dar
entrevista) de qualquer jeito. Todavia, como se negou a informar o nome, eu
disse que não o entrevistaria. Assim que o mesmo se afastou, os outros
confirmaram que ele é morador de rua, mas que é ex-presidiário. Também ficou
claro que o grupo não é de andarilhos, pois vivem nas ruas de Arujá há muitos
anos. Alguns deles têm problemas de pele, “tipo alergia que coça”, falaram. “Acho
que é doença de pombo”, disse um deles, “a prefeitura podia dar um remédio pra
gente”, concluiu. Deu para perceber que pelo menos os mendigos que foram
ouvidos não gostam de falar do passado, não dão muito detalhes da vida
particular, principalmente o motivo que os levou a viverem nas ruas, levando-se
em consideração que todos tinham casa e família, e que os mesmo não têm perspectivas
de saírem das ruas. A maioria admite que ingere cachaça, ou seja, que são
alcoólatras.